Por Ana Paula Pereira de Campos Lettieri, Giselle dos Santos Valério, Lígia Maria Mello Dias, Mariana Frota Agum, Paolla Clayr de Arruda Silveira, Priscila Gonçalves Santos e Rafael Ferreira de Souza.
Texto 1: PINHEIRO, Ethel. Cidades-Entre: Dimensões do Sensível em Arquitetura ou A
Memória do Futuro na Construção de uma Cidade. Tese de Doutorado, PROARQ. UFRJ,
2010. (pag. 45 a 60). [1]
Transitoriedade (2.1.1)
Na primeira subseção analisada, a autora traz uma reflexão acerca da complexidade da
cidade contemporânea, das novas formas espaciais que conformam a urbe e das
características que a diferenciam de cidades de outras épocas, onde a centralidade exercia um
papel fundamental no fluxo, uso e circulação dos citadinos. Ao falar sobre a conurbação
existente nas ‘mega-cidades’ da China, a autora pondera:
A dimensão desta nova megalópole é avassaladora; ela começa sem referências
históricas, sem diretrizes estipuladas pelo passado. Ela é marcada pelo valor da
transitoriedade e da aceitação irrestrita (PINHEIRO, 2010, p.45).
Portanto, essa nova configuração dos espaços urbanos, juntamente com a aceleração e
explosão dos meios de comunicação, assentam as bases de ação e convívio social, trazendo
mudanças, rupturas e também possibilidades outras:
(...) o mundo contemporâneo está marcado por uma concordância, quase universal,
de que a diferença e a transitoriedade não são meramente inevitáveis, porém boas,
interessantes e precisando de cultivo (Ibidem, p.46).
Nesse novo contexto de transitoriedade, a imagem da cidade e as imagens na cidade,
ganham um vulto de valorização nas apreensões do entorno, gerando um bojo
comunicacional imagético de suma importância para a arquitetura e urbanismo do século
XXI: “(...) a espetacularização da vida cotidiana e a transitoriedade dos vínculos e do espaço,
impressa pela valorização da imagem” (Ibidem, p.47). E ainda:
Podemos utilizar a metáfora da fotografia: o que queremos consumir está na
planície da visão, na superfície das formas. Não consumimos os edifícios, que
atualmente mal digerimos por conta da velocidade nas vias expressas; consumimos
imagens, que se deslocam imaterialmente com as necessidades de consumo.
Consumimos a transitoriedade e a mobilidade. Pode-se dizer, então, que a
arquitetura atual, no fim das contas, é propriedade dos críticos e torna-se textual em
vários sentidos, além de narrar um tempo outro que o seu (Ibidem, p.47).
Essa transitoriedade e descentralização, características da cidade contemporânea,
estariam colocando o citadino num lugar histórico particular, onde as instâncias temporais se
imbricam, numa difícil dissolução dos limites históricos em que a cidade e a arquitetura se
fundamentaram, até o período moderno. A cidade pós-moderna dilui a relação espaço-tempo,
gerando assim, um novo modo de percepção e retenção das imagens que criamos da cidade,
logo, da memória[2].
Virtualidade como Tensão de Possibilidades (2.1.2)
“Sob certo ângulo, as linguagens apresentam-se como ferramentas não neutras de
interação com o que é externo ao intelecto, carregando uma concepção mutante de
visões de mundo, preconceitos, conhecimentos e ideias. A construção de
significados é constante e obedece a uma dinâmica similar ao da conceituação de
cidades” (PINHEIRO, 2010, p.48).
A segunda subseção abordada no texto busca elucidar questões intrínsecas a definição
do que seria virtual e de como poderíamos categorizar e diferenciar o virtual da virtualidade.
Grande parte das ideias apresentadas provém da confrontação com os escritos de Pierre Levy,
porém, contemplando também reflexões de autores outros como Félix Guattari e Gilles
Deleuze (ambos representantes do desconstrutivismo e das múltiplas possibilidades de leitura
e interpretação das linguagens, signos e sintaxes):
(...) o virtual era a brecha de um espaço (intangível, mas possível) conformado por
inúmeras possibilidades temporais; virtual é o mundo que tentamos acompanhar e
ele é feito por experiências agregadas como tempo. Virtualidade é uma qualidade
que extrapola o acontecimento no plano real, ou seja, é a vivência com um tipo de
memória disposta por várias passagens, inclusive –e principalmente –as visões de
futuro (Ibidem, p.49).
Esse esforço de amparar as bases da virtualidade e do virtual vai de encontro ao
entendimento do que seria tangível, jogando luz nas potencialidades contidas nessas novas
formas do viver, desse alargamento, dessa extensão da vida condicionada pelas tecnologias de
comunicação, contudo com o cuidado de preservar a essência da consciência:
O tangível é tão problemático e reconfigurável quanto o virtual; igualmente não
acontece sem que sejam descartadas – pelo tempo e rumo dos acontecimentos – as
diversas outras possibilidades excludentes que se afiguram a partir de uma dada
situação inicial (Ibidem, p.50).
Espaços virtuais ampliam e amplificam o intelecto, mas em última instância,
mesmo que extrapolado em suas possibilidades interacionais com as coletividades,
este mesmo intelecto continua a sediar a consciência (Ibidem).
Essa característica do modus operandi das cidades contemporâneas estariam, de certa
maneira, constituindo um novo espaço-tempo inter-relacional, catalisador de uma memória e
uma imagem da cidade nunca antes capacitada, onde o virtual seria portador de faculdades de
sua própria definição linguística das ‘possibilidades’, integradas a essa cidade imaterial,
produzida e substanciada através de nossa subjetividade e catapultada na percepção
multissensorial dos espaços da urbe:
O virtual pertence, então, ao pólo do possível, porque denota o quanto algo pode ser
naquele momento. Ele trabalha, exatamente, a noção de ‘entre’, através da
congregação dos tempos, que é a noção de Memória do Futuro (Ibidem, p.51).
Para que a virtualidade corrobore com a imagem produzida e a forma de
experimentação das cidades contemporâneas, recorremos a um assunto já
mencionado e crucial na produção de cidades imateriais: a subjetividade, fato
inerente à evolução humana (Ibidem, p.52).
Subjetividade: uma recorrência à vida sensível? (2.1.3)
“A comunicação de nosso corpo com o espaço e o tempo é o que tem motivado a
maior parte das incursões na teoria arquitetônica sobre o futuro das cidades”
(PINHEIRO, 2010, p.52).
Nesta última subseção do texto a autora traz apontamentos que sublinham a
importância que a subjetividade alçou no contexto das dinâmicas das cidades do século XXI.
Algumas das reflexões tangenciam os conceitos do escritor Zygmunt Bauman acerca do
atributo líquido que perpassa as coisas, objetos e pessoas da sociedade contemporânea, onde
a memória se fragmenta em rebatimento as pluralidades fugazes das conjunturas e das
experiências cotidianas, apartadas do modelo vigente nos séculos passados:
O perecimento das coisas passa a representar a fratura dos sistemas e todas as áreas
adjacentes à formação de uma cidade (sua arquitetura, geografia, pessoas, laços
afetivos, sociais, culturais) se subjugam a isso e conformam as novas subjetividades
imperantes no século XXI (p.53).
E não somente as concretudes e os espaços urbano-arquitetônicos e nossos hábitos
foram alterados, porém da mesma forma, nosso sentido de coletividade[3] e nossa capacidade
dialética de compreensão de nosso âmago e de nosso espectro fulcral, extrínseco ao nosso
invólucro corporal.
Destarte, a operacionalidade de nossas subjetividades e de nossos modos de apreensão
e percepção dos sentidos, replica os ditames multifacetados dos ambientes urbanos e
arquitetônicos em frequente transmutação, galgados na rapidez e na brevidade das
sustentações de nosso porvir. Gerando o que autora apontou como uma ‘cidade-entre’[4], esse
novo lugar citadino espreitado entre o simulacro e o real:
Este ‘funcionamento’ das subjetividades contemporaneamente é algo inédito na
história mundial, pois oferece uma delimitação de profundidades que surge para
estruturar as formas de convivência como “Outro” na cidade (Ibidem).
As maneiras de sentir refletem, igualmente, um estado dado das condições de
sensorialidade: elas induzem, a partir de formas sensoriais inéditas, transformações
profundas nos processos de subjetivação e nos tipos de personalidade (Ibidem,
p.57).
A subordinação aos meios e ambientes em que vivemos nas cidades contemporâneas,
descolou o sujeito de suas tradições, costumes e modos de operacionalizar sua vida. O século
XXI trouxe consigo um novo paradigma comunicacional, que vem causando uma ruptura
drástica de nosso modus vivendi; a intensificação dos estímulos sensoriais, sobretudo visuais,
apoia-se nos modos de representação estética e imagética como base do consumo, inclusive
dos espaços construídos. Contudo, essa necessidade de abstração coloca o indivíduo em um
limiar delicado, que usurpa, em certa medida, a sua potencialidade de emancipação:
(...) a heteronomia e a alienação passam a caracterizar o indivíduo contemporâneo,
‘maculado’ em sua subjetividade, transitório em seus acontecimentos, complexo em
seu modus vivendi (Ibidem, p.59).
Texto 2: HAROCHE, Claudine. A condição sensível. (Tradução de Jacy Seixas e Vera
Avellar Ribeiro). Rio de Janeiro: Contracapa, 2008 [5]
Claudine Haroche é uma pesquisadora da Subjetividade, doutora em Sociologia que
atua na França, o que se torna interessante ser mencionado pelo viés do pensamento da
subjetividade em muitas outras pesquisas contemporâneas, sob as discussões da maneira
como os sujeitos são ou se portam em sociedade, preocupações fundadas na Sociologia,
amplamente discutidas em autores como Simmel e Mauss. O livro em análise vem destacar as
maneiras de sentir e perceber, que se alteram ao longo da história, sendo comum que um ou
mais sentidos predominem em cada momento.
Na Idade Média, por exemplo, prevaleciam a visão e o tato, e na modernidade
contemporânea, a visão e audição. Essas maneiras de sentir, refletem “um estado dado das
condições de sensorialidade”, o qual se relaciona tanto ao “modo de existência dos objetos”
quanto “às maneiras de perceber” do homem, como se houvesse o processo de “contenção”
do ser no mundo, ou seja, numa representação distinta do corpo, instaurando e permitindo a
existência do sujeito.
Posto isso, discorre sobre marcas que caracterizam a contemporaneidade e os
indivíduos que fazem parte dela, dentre as quais estão a fluidez, a exposição permanente a
informações e sensorialidades, a perda de referências simbólicas, a exteriorização do sujeito,
o individualismo, a falta de atenção e o estreitamento da consciência, fazendo emergir
maneiras inéditas de sentir, buscando ultrapassar o convencional, presente nos usos e ritos
codificados baseados em alguma ordem de precedência, numa espécie de protocolo, posturas,
pudores, respeitos. Esse momento de ruptura que Haroche se refere é colocado como uma
relação entre deslocamento e mobilidade, que abalam o papel estruturado do espaço,
concebendo “eus instáveis e efêmeros”.
Diante de toda essa complexidade, discute – a partir da visão de um conjunto de
autores – sobre as transformações que tem se transcorrido nas maneiras de sentir na
contemporaneidade, levantando questionamentos sobre as condições e a própria permanência
da capacidade de sentir e, indicando o problema da atenção relacionada ao excesso de
experiências sensoriais como a grande questão do século XIX.
Com base em Hume (1739), aponta para o papel da fragmentação e da
descontinuidade das sensações na elaboração da percepção e como própria condição do
pensamento, contrapondo essa necessidade à nova realidade, na qual passamos a não ter
tempo para refletir, para exercitar a consciência, e estamos a todo o tempo suscetíveis a
influências de estímulos constantes e silenciosos que nos afetam, o que ela denomina como
uma “revolução silenciosa”, ao elaborar a ideia de que o objeto continua a existir, mesmo
quando está ausente para nós.
A alternância entre movimento e pausa é, num primeiro momento, colocada como
algo imprescindível para a percepção e o pensamento, e como algo inexistente na atualidade,
onde o movimento é incessante. Segundo Adorno e Horkheimer, tal condição gera surdez e
cegueira físicas e psíquicas, atrofiando a imaginação e a espontaneidade.
Janet (1889) corrobora com esse pensamento e defende, ainda, “o automatismo
psicológico sobre os mecanismos sensoriais”, levantando que “é a ausência ou a presença de
sentimentos que permite que afirmemos que um indivíduo tem ou não consciência”. Para o
autor, quanto mais inteligente o homem se torna ao longo de sua evolução, há uma tendência
de redução, e mesmo desaparecimento, dos sentimentos.
“Nas sociedades contemporâneas, a sensação contínua e o movimento permanente
transformaram os funcionamentos da sensorialidade: estimularam o desinteresse,
descompromisso e desengajamento e afastaram a ideia de limite, de consciência, e a
noção do eu mesmo” (HAROCHE).
Nesse contexto, autores como Gitlin evidenciam o papel das mídias como
intensificadoras desse fenômeno, afetando principalmente os sentidos da visão e audição –
visto que no audiovisual ouvir e ver se confundem – e contribuindo para tornar os indivíduos
desatentos e distraídos. Com base em Balandier, Haroche destaca que “embora a mobilidade
seja uma dimensão intrínseca à mídia, a multiplicação e a extensão dos domínios desta fazem
com que os efeitos de realidade tendem a se tornar toda a realidade, num crescente estado de
indistinção”.
Tocqueville, por sua vez, aponta essa desatenção como algo perigoso, uma ameaça, e
o maior “vício da democracia”, que estimula a incapacidade de escuta. “A transformação nas
maneiras de sentir, de perceber, acompanha-se de uma mudança da personalidade
contemporânea”, marcada pela superficialidade, na qual se evita a relação com o outro,
provocando isolamento. Tal concepção, faz parte do que Gauchet aponta como “contornos da
personalidade contemporânea”, caracterizados pela “renúncia de si e indiferença em relação
aos outros”.
“sobreviver significa não apenas se movimentar, se deslocar, mas ter a possibilidade
de refletir, de ser ativo em seu pensamento. Sobreviver é vivenciar sensações
difusas, passageiras, intensas, mas também poder experimentar sentimentos –
duráveis e profundos – que permitem pensar, distanciar-se e, a partir daí, perceber e
reconhecer o outro, respeitá-lo” (HAROCHE).
Nessa visão sobre o sujeito, Simmel aponta os sentimentos como efeitos do seu modo
de vida, afirmando que “os comportamentos induzem os sentimentos”. O autor agrega à
discussão o conceito de “alma moderna”, a definindo como uma impressão de tensão, de
melancolia, uma insatisfação, sentimento de urgência, busca por uma satisfação passageira,
por estímulos sempre novos, sensações e atividades exteriores.
O texto destaca ainda que, em geral, os trabalhos sobre a temática tendem a colocar
maior enfoque sobre os sentidos da visão e da audição, entretanto, o tato exerceria função
essencial, pois é ele que “garante, protege e possibilita o desenvolvimento e a presença do
vínculo e do afeto no pensamento, contra a indiferença e o insensível”.
Após levantar os questionamentos iniciais e apresentar a ótica dos referidos autores, o
texto caminha para a consolidação de uma visão que aponta não para o desaparecimento da
percepção, mas para o surgimento de novas formas de sentir.
Nesse contexto, Bergson interpõem questionamentos sobre como perceber quando o
movimento é permanente, e sobre a possibilidade de escolher por não agir no movimento
incessante. Segundo este autor, “jamais há imobilidade verdadeira, se por isso entendermos a
ausência de movimento. O movimento é a própria realidade, e o que chamamos de
imobilidade, um determinado estado da coisa”. E complementa que “nossa própria pessoa é
mobilidade”.
Para Bauman, por sua vez, diante da fluidez, “os atuais centros de produção de sentido
e de valor estão desterritorializados”, já que “as localidades perdem, pouco a pouco, a
capacidade de produzir e de tratar da significação”, ao considerar a condição de fluidez, que
vem a vincular com a fala de Legendre, ao mencionar que na indiferenciação há a ameaça de
uma regressão.
Nesse sentido, Haroche permeia o trabalho na discussão do caráter transdisciplinar, ou
até mesmo, indisciplinar, quando entende que as pesquisas subjetivas deve levar os olhares
para as bordas, não como fronteiras, posto que algumas áreas causam ruídos em outras
disciplinas, e para abordar o registro dos sentidos e dos sentimentos, é necessário flexionar as
condições de genealogia do indivíduo e sujeito, por todo o percurso histórico, desde o século
XVI até a contemporaneidade.
Na perspectiva da autora, que em diversos momentos do texto traz perguntas retóricas,
como modo de colocar o leitor numa posição de desconforto a fim de levá-lo a pensar sobre
quais seriam as possíveis hipóteses, até o ponto de provocar ao dizer: “percepções e ideias
podem perdurar, e mesmo existir, quando o movimento é incessante?”.
O texto vai transcorrendo e, por volta da conclusão, indicando a necessidade de
repensar o papel da sensorialidade e da percepção, levanta uma série de outros
questionamentos e reflexões a partir da visão de que “a duração, a estabilidade, o sentimento
de continuidade, a confiança e a profundidade”, apontadas por diversos autores como
essenciais à constituição do pensamento e da percepção tendem, cada vez mais, a se tornar
ausentes. As sensações substituíram as percepções e afastaram a alternância entre movimento
e pausa, cabendo aos pesquisadores da subjetividade o olhar crítico sobre presença de vínculo
somado ao afeto do pensamento, confrontando a indiferença e o insensível do sujeito na
cidade.
Texto 3: GUATTARRI, Felix e ROLNIK, Suely. Micropolítica: Cartografias do Desejo.
Petrópolis: Ed. Vozes, 1996. (pág. 281-290)
Sobre os autores:
Felix Guattari é um pensador de questões que atravessam vários campos do
conhecimento. Filósofo, psicanalista e militante político, colaborou com a criação de
diversos conceitos e teorias. Aventurou-se em muitos textos individuais e coletivos, dentre
eles, o livro “Micropolíticas”, que trata amplamente o tema da subjetividade de modo
indissociável com as questões políticas. O autor conduz em seus textos fortes críticas ao
capitalismo e apresenta-o como problemática da contemporaneidade.
Suely Rolnik é fundadora do núcleo de estudos da subjetividade da PUC-SP.
Psicanalista, escritora e professora. Sua investigação enfoca as políticas de subjetivação em
diversos contextos. Rolnik aborda a subjetividade através de uma perspectiva
transdisciplinar que está diretamente ligada a uma pragmática clínico-política. A autora
busca em suas abordagens trazer questões sobre a micropolítica, mas como experiência
interna do sujeito. Suas críticas e conceitos estabelecem fortes colaborações ao tema da
subjetividade.
Sobre a obra:
Organizado por temas o Livro “Cartografias do Desejo” consiste em uma montagem
composta por fragmentos de um material diverso produzido durante a visita de Guattari ao
Brasil a convite de Rolnik. São compostos por 3 tipos de componente: aforismas; pedaços
de conversa, de debate, de discussão, de entrevista, de mesa redonda ou de trechos de
cartas trocadas entre Guattari e Rolnik; e trechos de ensaios de Guattari, de textos de Rolnik
e de pessoas que durante a viagem foram ganhando espaço.
Livro datado pelos acontecimentos que o geraram, o Brasil de 1982, marcado pela
intensificação do movimento de redemocratização macro e micropolítica: eleições,
proliferação de grupos organizados de minorias, uso do termo alternativa para designar
práticas sociais dissidentes (ecos dos anos 70). O livro cartografa as experiências e
confrontos e a busca por saídas na constituição de outros territórios possíveis para o Brasil
de 1982. O livro busca investigar possibilidades para as estratégias da economia do desejo
no campo social, aquilo que Guattari denominou de micropolítica.
Capítulo VI: Amor, territórios de desejo e uma nova suavidade…
Neste capítulo o amor e os territórios do desejo estruturam as reflexões acerca da
produção de subjetividade na contemporaneidade e sua interlocução com o modo de
produção capitalista, os processos de captura e as possibilidades de contra capturas na
produção de novas subjetividades que escapam ao capitalismo.
Guattari defende que a subjetividade é vinculada ao plano do desejo, enquanto
materialidade de onde emanam e sustentam-se as produções coletivas. Da mesma forma, a
produção de subjetividade seria, para o autor, indissociável de uma multiplicidade de
vetores que se atravessam constante e incessantemente. Nesse sentido, descentraliza a
noção de subjetividade, antes comumente considerada um produto exclusivo de uma
instância psíquica e individual, em favor de uma perspectiva coletiva. Sendo assim, trata-se
igualmente de fenômenos que dizem respeito à política, ao Estado, às tecnologias, bem
como ao espaço urbano, aos meios de comunicação, à vida cotidiana e às mais variadas
formas de agenciamentos indicativos das multiplicidades e dos diversos fluxos sociais.
Deste modo, Guattari vislumbra uma relação entre os processos de subjetivação e o
modo de funcionamento do sistema capitalista, afirmando que o segundo cada vez mais se
entrelaça ao primeiro e propõe uma concepção de subjetividade essencialmente fabricada,
modelada, recebida, consumida.
Ao operar na base dos comportamentos perceptivos, sensitivos, afetivos, cognitivos
e linguísticos, o capitalismo transforma a instância individual numa espécie de terminal
consumidor das demandas artificialmente produzidas pelos dispositivos capitalistas de
controle como as mídias, a informática e as produções técnico-científicas. Atuando no
âmbito do desejo, os agenciamentos do poder capitalista permitem, assim, que a sociedade
invista nos valores dominantes instituídos por este poder e construa possibilidades de
futuro, de devir, que interessam à acumulação de capital.
No que se refere à natureza do tratamento dado ao desejo com relação ao sentimento
amoroso na subjetividade capitalística, Guattari defende haver uma encarnação de modelos
pretensamente universais nos quais os sentimentos amorosos são reduzidos a uma esfera de
apropriação do outro. Nas palavras do autor:
"Há um certo tratamento serial e universalizantes do desejo que consiste
precisamente em reduzir o sentimento amoroso a essa espécie de apropriação do
outro, apropriação da imagem do outro. E através desse mecanismo de
apropriação se dá a constituição de territórios fechados e opacos, inacessíveis
exatamente aos processos de singularização, sejam eles de ordem da
sensibilidade pessoal ou da criação, sejam eles da ordem do campo, da invenção
de um outro modo de relação social, de uma outra concepção de trabalho social,
da cultura, etc.”(p.281)
Esse estado de “cegueira” dos “corpos sem órgãos” que se apropriam do outro ou da
imagem que atribuem ao outro e, consequentemente, criam territórios fechados e opacos
têm sido a base para construção de um estado de neurose da vida conjugal fazendo com que
“os sentimentos amorosos mais promissores caiam em território de inferno” (p.281). Afinal,
a própria relação conjugal é universalizada, um modelo é sacralizado, e sob ela se encarnam
devires maquínicos. Devires estes que estruturados a partir da montagem maquínica vão
incessantemente buscar (re)criar um estado de segurança, uma territorialização.
“A questão da montagem de expressão, da montagem maquínica - que muda os
dados, que os remaneja, que propulsiona novas referências, novos universos - é
inseparável da questão dos territórios ou dos ‘corpos sem órgãos’ sobre os quais
se inscrevem, se marcam, se encarnam os devires maquínicos, os processos
incoporais. Mas é bem aí que está toda a ambiguidade do território, da
desterritorialização e das reterritorializações.” (p.282)
Diante deste quadro, Guattari defende a existência de dois tipos de comportamento:
a desterritorialização, traduzido por ele na figura de Ulisses, e a simbiose, traduzida na
figura de Penélope. Ulisses está em busca da sua liberdade e sente repetidas vezes vontade
de abandonar Penélope, pois se sente sufocado por ela, por sua carência e vontade de
presença. A desterritorialização está associada à ideia de aventura, de andar por toda parte,
sem estar em parte alguma. Aqui o mundo torna-se absoluto na existência de Ulisses e o
outro (todas as outras) que ele penetra, “a sensação de destruição (na presença) é
indissociável de uma esperança: a de uma sensação aliviadora de reconstrução (na
ausência) – condição de existência dos Ulisses” (p.286).
A simbiose é representada pela vontade de espelho, a vontade de ficar, nela o
mundo torna-se absoluto na existência dela (Penélope) e do outro (Ulisses) dentro dela.
Vale ressaltar no entanto que no caso de Penélope “a sensação de destruição (na ausência) é
indissociável de uma esperança: a da sensação aliviadora de reconstrução (na
presença)”(p.286), afinal o retorno de ulisses lhe devolve a certeza de ser mulher.
No entanto, ambos estariam intrinsecamente conectados, entrelaçados e seriam
interdependentes entre si, “os dois que precisam tanto do abandono, quanto do grude, pacto
simbiótico. Ambos precisam dessa intermitência" (p.286). É o medo da desterritorialização
que nos faz sucumbir ao enclausuramento na simbiose, assim como é o medo do
enclausuramento na simbiose que nos faz sucumbir à desterritorialização.
“Em um dos extremos, é ao medo da desterritorialização que sucumbimos: nos
enclausuramos na simbiose, nos intoxicamos de familialismo, nos anestesiamos a
toda sensação de mundo, endurecemos. No outro extremo — quando já
conseguimos não resistir à desterritorialização e, mergulhados em seu
movimento, tornamo-nos pura intensidade, pura emoção de mundo —, um outro
perigo nos espreita. Fatal agora pode ser o fascínio que a desterritorialização
exerce sobre nós: ao invés de vivê-la como uma dimensão imprescindível da
criação de territórios, nós a tomamos como uma finalidade em si mesma. E,
inteiramente desprovidos de territórios, nos fragilizamos até desmanchar
irremediavelmente. Entre esses dois extremos, ou essas diferentes maneiras de
morrer, ensaiam-se desajeitadamente outros jeitos de viver. E todos esses vetores
da experimentação coexistem, muitas vezes na vida de uma mesma
pessoa.”(p.284)
Um necessita do outro, um não existe sem o outro, um se afirma no desejo do outro,
assim, os dois se perdem na imagem do outro: “montagens desintoxicadas da vida de
redução do desejo de mundo a um objeto-pessoa ou uma pessoa-objeto”(p.289).
Penelope controla o tempo: tece a trama da eternidade. UIisses controla o espaço:
monta a imagem da totalidade. Dois estilos complementares da vontade de
absoluto: imobilidade morna e melosa, mobilidade fria e seca. E a mesma
esterilidade. Uma só neurose: equilíbrio homeostático. Medo de viver. Vontade de
morrer. Penélope e Ulisses somos todos - em diferentes matizes, a cada momento.
(p.288)
Ao viverem as suas individualidades e por medo de experimentarem o universo um
do outro, perdem a capacidade de criar territórios. Deste modo, Guattari defende que quem
perde é o amor.
Exauridos de tanta repetição, constatamos que ficar enaltecendo (como Penélope)
a volta ao aconchego do lar - o confinamento conjugal -, ou (como Ulisses) a
liberdade da aventura - que só existe em função de seu eterno retorno aquele
ninho - apenas mascara o medo da desterritorialização, por vontade de absoluto.
E não é só isso. Constatamos também que ficar enaltecendo essa liberdade de
circular desencarnadamente, sem Penelope alguma a nos espelhar em sua espera
(máquinas celibatarias), acaba nos desencarnando e da própria vida.
Consternados, descobrimos que por ter pretendido nos livrar do espelho, o que
acabamos perdendo é a possibilidade de envolvimento - como se a única ligação
possível fosse a especular. Por ter pretendido nos livrar da simbiose, o que
acabamos perdendo é a possibilidade de montagem de territórios - como se a
única montagem possível fosse a simbiótica. (288-9)
Outro ponto importante que Guattari ressalta é a capacidade do tempo agir sobre os
personagens, Penélope e Ulisses, modificando-os sem contudo alterar a posição à qual estes
se colocam diante do outro.
Além disso, não é sempre o mesmo Ulisses que Penélope espera voltar; não é
sempre a mesma Penélope que Ulisses abandona ao partir - eles variam, e cada
vez mais. No entanto, a cena é sempre a mesma: há sempre uma mulher que
desempenha a Penélope para ele, sempre um homem que desempenha o Ulisses
para ela (ou vice-versa). Remanescentes ativos de urna familia desaparecida, que
reproduzimos artificialmente sob as mais variadas formas. (p.288)
Uma nova suavidade
“hoje em dia as margens (os marginatti), as novas formas de subjetividade,
também podem se afirmar em sua vocação de gerir a sociedade, de inventar uma
nova ordem social, sem que, para isso, tenham de nortear-se por esses valores
falocráticos, competitivos, brutais, etc. Elas podem se expressar por seus devires
de desejos.” (p.283)
Face a esses modelos afetivos apresentados por Penélope e Ulisses, o autor propõe
uma nova suavidade que corresponde “ao contrário, a novos coeficientes de
transversalidades, à invenção de novas constelações de Universo (devir mulher, devir
música, etc).”. No texto ele enfatiza a criação de outros territórios de desejo, criação esta
que está claramente relacionada à micropolítica da subjetividade, que só é possível através
do processo de desterritorialização e reterritorialização.
“a nova suavidade é o fato de que, efetivamente, (outros devir) podem inserir-se
nos rizomas de modos de semiotização, sem por isso comprometer o
desenvolvimento de uma sociedade, o desenvolvimento das forças produtivas e
coisas assim” (p.283).
Guattari nos convida a ir para além do espelho:
“Um além do espelho, onde o outro não seja mais aquilo que delineia nosso
contorno (Ulisses/Penélope), nem uma paisagem fugaz com a qual, máquinas
celibatárias, não criamos coisa alguma. Um além do espelho onde nossa viagem
não seja nem mais aquela (agarrada) de um Ulisses, nem aquela outra
(desgarrada) das máquinas celibatárias. Viagem solitária: uma solidão povoada
pelos encontros com o irredutivelmente outro.” (p.290)
Uma nova suavidade “além do homem (humano e/ou desumano)” - “Amor não
demasiadamente tão humano, nem tão demasiadamente desumano”, onde campos de
intimidade se instauram - Territórios-pousada. Uma certa inocência, uma nova forma de
amar, um devir-nuvem, como diria Deleuze. A proposta da nova suavidade busca encontrar
uma outra relação para os corpos, uma superação da oposição eu-outro, uma conexão, onde
somos fios que se conectam e se constituem formando teias.
“Mas como seria essa viagem? Dela sabemos apenas duas ou três coisas. A primeira
é que ela só se faz se preservarmos o conquistado pelas máquinas celibatárias — ter
autonomia de voo, um voo onde o encontro com o irredutivelmente outro nos
desterritorializa; ser pura intensidade desse encontro. A segunda é que, se isso é
necessário, não é suficiente: ao mesmo tempo que se dá a desterritorialização, é
preciso que, ao longo dos encontros, territórios se construam” (p.290)
Nesse contexto, os autores destacam a ideia de se criar novos planos conscientes que
não impeçam o movimento. Salientam a necessidade de criar aberturas, espaço para as
intensidades e o improviso. Não é revelado muita coisa dessa viagem, mas eles ensinam a
importância de se ter autonomia de voo e a partir desse encontro com o outro ocorrer a
desterritorialização, contudo isso não é o bastante é preciso o desejo de multiplicar-se, ou
seja, pretender construir novos territórios.
No entanto, devemos estar atentos nessa “nova suavidade” à cilada do espelho, isto é,
ao impulso de não suportarmos a estridência de sons inarticulados, o estado de desconforto
gerados por situações novas, híbridas e aparentemente caóticas. O caos caotizante que
mistura sons em desarmonia e nos ameaça com a surdez para os afetos.
“Há ruídos, sons inarticulados, e muitas vezes não suportamos esperar que uma
composição se faça: na pressa de já ouvi-la, corremos o risco de compor esses
sons com velhos clichês. É difícil não cair na pieguice de um final feliz“.
É previsível a continuidade de um modelo social ultrapassado. Rolnik faz uma
comparação do indivíduo com “replicador” desse molde. “Na verdade, o que não suportamos
é a estridência desses sons inarticulados. É o “nada mais daquilo tudo”. O que não
suportamos é que somos um pouco Penélopes, um pouco Ulisses, um pouco máquinas
celibatárias, um pouco replicantes… e um pouco nada mais daquilo tudo.” Estamos ainda em
um processo de descolonização do desejo, no caminho das novas sintonizações do amor, do
abandono dos modos de subjetivação existentes para criar a possibilidade de novos modelos,
“no entanto, nos momentos em que, desavisados, conseguimos suportá-lo, descobrimos com
certo alívio que, do convívio desencontrado dessas figuras, destila-se já uma nova
suavidade”.
A quebra dos espelhos nos ensina que é importante possuir autonomia de voo. E esta
se faz juntamente com a construção de novos territórios. Uma linha de fuga criadora, um
desejo de multiplicar-se, criar zonas autônomas, encontrar alianças brilhantes, que nasçam
da potência dos encontros. Quando as respostas do passado se tornam defasadas, nos
perguntamos novamente: O que é o amor? Certamente não há uma resposta definida, porém
nos tornamos mais suaves para procurar as respostas.
ASPECTOS CONCLUSIVOS
Como visto no texto de Pinheiro, a cidade contemporânea é composta por diversas
dimensões, as quais algumas se contrapõem às estruturas mais clássicas de uma cidade. Um
dos principais propulsores dessas dimensões é a cultura do consumo, sendo a responsável
pela “transitoriedade dos vínculos e do espaço, impressa pela valorização da imagem” (p. 47).
Dessa maneira, a cidade contemporânea, à luz de uma cultura do consumo, se relaciona às
características como descentralização, virtualidade, perda das referências simbólicas, mídias,
diluição da relação tempo-espaço, complexidade, fragmentação, fluidez.
Nesse contexto, o processo de subjetivação e afetação do sujeito pela cidade é
transformado. A vida ágil da contemporaneidade torna “o objetivo final (ser) mais importante
do que o processo (por que ser)” (PINHEIRO, p. 53). A constituição do sujeito por meio dos
seus territórios de desejo resultam em desterritorializações rápidas e constantes e a falta de
consolidação na vida psíquica, importante para a criação de vínculos, sejam eles interpessoais
ou espaciais. Para Haroche (2008), o espaço é decisivo na constituição do sujeito e a cidade
contemporânea marcada pela transitoriedade provoca um sentimento de angústia,
despossessão, desconfiança e indiferença, que leva o sujeito a uma contenção do espírito
comportamental, assim, provocando a dificuldade da consolidação sensorial em novos
territórios.
Para Rolnik, é subtraída a capacidade de envolvimento, sendo substituída pela
especulação. “O capital inflacionou nosso jeito de amar: estamos inteiramente desfocados”.
Neste mesmo sentido, Guattari nos convida a buscar uma outra relação para os corpos e uma
nova sintonização para o amor, defendendo a necessidade de criação de territórios do desejo
que se relacionem diretamente com as micropolíticas da subjetividade.
É preciso repensar o papel da sensorialidade e da percepção, entender como a
alteridade se estabelece na cidade contemporânea e descolonizar o desejo. Enquanto
pesquisadores da subjetividade, é esperado que possamos nos habituar a ter um olhar crítico
sobre as dinâmicas de afeto nas cidades contemporâneas e as possibilidades de criação de
novos modelos de subjetivação.
ALINHAMENTO COM AS PESQUISAS - Alunos no PROARQ/UFRJ
● Ana Paula Lettieri - Doutorado
O foco da minha pesquisa está no ambiente gerado no entorno dos hospitais gerais da
cidade de Campos dos Goytacazes, localizada no estado do Rio de Janeiro, buscando
investigar os impactos sensíveis sobre sua qualidade, do ponto de vista da percepção do lugar
e de sua relação com a paisagem urbana. A partir dos textos lidos para o seminário da
disciplina, foram identificadas correlações no que diz respeito às subjetividades inerentes às
paisagens urbanas, especialmente na cidade contemporânea, e suas diferentes percepções e
significações para os diversos sujeitos que a vivenciam. Também oportunizou-se a reflexão
sobre a importância de atentar para o fato de que as maneiras de sentir se alteram ao longo da
história, e compreender as novas maneiras de sentir – apontadas pelos autores – torna-se
essencial para analisar como esses entornos impactam as pessoas.
● Mariana Agum - Mestrado
O foco da minha pesquisa no PROARQ/FAU/UFRJ está no estudo das ambiências
urbanas em locais de vulnerabilidade ambiental associada às ações antrópicas no meio
ambiente, buscando formas de fomentar uma comunicação participativa e de ampliar a
conscientização da população local. Os textos abordados neste seminário colaboram para o
entendimento das ambiências urbanas e da subjetividade frente às cidades contemporâneas,
deixando clara a necessidade de compreender as novas dinâmicas de afeto em constante
movimento. Além disso, evidenciam e discutem a reciprocidade de afetação entre o ser e o
ambiente, que é um ponto chave da pesquisa, uma vez que as degradações ambientais seguem
este mesmo comportamento.
● Paolla Clayr - Doutorado
A pesquisa tem seu foco voltado às expressões do grafite de rua na cidade de Campos
dos Goytacazes, Rio de Janeiro, especialmente às manifestações artísticas presentes no centro
comercial e histórico, com ênfase onde estão localizadas essas obras, nos seus lugares e
não-lugares. Os autores abordados neste seminário alinham conceitos da subjetividade da
cidade contemporânea, nas percepções do sujeito e suas participações no espaço, seus modos
de vivenciar e percebê-los, senti-los e significá-los, num processo mútuo de troca: cidade e
sujeito, sujeito e cidade, reconhecendo a transdisciplinaridade (ou indisciplinaridade?) da
arquitetura somada às outras áreas de estudo.
● Rafael Ferreira - Doutorado
A pesquisa que desenvolvo no PROARQ/FAU/UFRJ visa em última instância investigar
a essência e os sentidos das ruínas industriais da cidade de Petrópolis, no Estado do Rio de
Janeiro. De cunho fenomenológico, a investigação busca mesclar ações de campo
experimentais, nos moldes do grupo Urbex (Nomenclatura para Urban Exploration em
inglês), e teorias da arquitetura e fenomenologia desenvolvida por arquitetos-teóricos como
Juhani Pallasmaa, Christian Norberg-Schulz e Jorge Otero-Pailos. Através deste arcabouço, o
estudo parte dos processos de intersubjetividade produzidos entre os espaços cognitivos e
físicos, para estruturar uma metodologia de leitura dos espaços arruinados, das fábricas
abandonadas, captando assim através da percepção multissensorial (Merleau-Ponty, 1999), as
ambiências sensíveis e a linguagem emanada pela imagética das arquiteturas em ruínas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HAROCHE, Claudine. A condição sensível. (Tradução de Jacy Seixas e Vera Avellar
Ribeiro). Rio de Janeiro: Contracapa, 2008
PINHEIRO, Ethel. Cidades-Entre: Dimensões do Sensível em Arquitetura ou A
Memória do Futuro na Construção de uma Cidade. Tese de Doutorado, PROARQ. UFRJ,
2010. (pag. 45 a 60).
GUATTARRI, Felix e ROLNIK, Suely. Micropolítica: Cartografias do Desejo.
Petrópolis: Ed. Vozes, 1996. (pág. 281-290)
NOTAS
[1] Este fichamento é baseado nas três subseções (2.1.1; 2.1.2; 2.1.3), da seção (2.1) Conceituando
Cidade, do capítulo 2 (Cidade e Contemporaneidade: Complexidade de Definições).
[2] Cf.: Através do conceito de Memória do Futuro, que apresentaremos como resposta à
transitoriedade das cidades, poderemos buscar nos relatos deste passado-presente-futuro uma cidade
nunca perdida, antes, arquivada em uma das ‘pastas dinâmicas’ construídas para suportar a
mobilidade de homens e cidades (PINHEIRO, 2010, p.47).
[3] Cf.: Quando se esvaem as fronteiras entre o homem exterior e o interior, entre a coletividade e a
individualidade, surge a ‘familiaridade’, a sensação de que o mundo compartilhado ‘em todo lugar’ é
permissível, é público (...) (PINHEIRO, 2010, p.56).
[4] Cf.: Sensibilizar-se, criar estratégias de fuga e recompor-se na cidade contemporânea são as
máximas da positividade, que defendem a ideia da cidade ‘entre’ (PINHEIRO, 2010, p.51).
[5] Este fichamento está baseado nas partes de Prefácio, Introdução, Capítulo 12 e Conclusão do livro
em questão./
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